Digo não à blue Monday!

(Crónica publicada no blogue Steff’s World – a soma dos dias e no Jornal Fórum

Sabiam que a última 2ª feira foi o dia mais triste do ano? Sabem porque é que se considera a terceira segunda-feira do mês de janeiro o dia mais triste do ano? Venham daí!

E eis que chegou aquele dia que tantos temiam desde o início do ano. Sim, aquele dia pouco simpático, triste, deprimente e deprimido a que se convencionou chamar de “Blue Monday”, o dia mais triste do ano! É verdade! Para aqueles menos atentos ao calendário, venho relembrar que esta é a terceira segunda-feira de janeiro e que, como tal, dia 15 estaremos perante a já famosa “Blue Monday”.

Desde 2005, e como consequência de um estudo do psicólogo Cliff Arnall, que se denomina a terceira segunda-feira do mês de janeiro como o “dia mais triste do ano”. O dia teria sido calculado pelo psicólogo tendo em conta vários fatores, que combinou numa equação, que tinham em consideração factos como:

– as condições climatéricas que se fazem sentir nesta época;

– as despesas (ou até as dívidas) contraídas durante as festas de Natal e Ano Novo;

– o facto de já ter decorrido tempo suficiente para percebermos que, mais uma vez, falhámos redondamente nas nossas resoluções para o novo ano;

– os baixos níveis de motivação habituais nesta época;

– a sensação que queremos realizar mudanças nas nossas vidas mas que ainda não fizemos nada para criar essas mudança, para atingir as conquistas que pretendíamos atingir neste 2024.

É claro que há muito que esta teoria foi catalogada como pseudociência e que se percebeu que ela não passava de uma manobra de marketing. Contudo, a ideia ficou e todos os anos nos lembramos que a terceira segunda-feira do mês de janeiro é dia de nos sentirmos tristes e meio zangados com o mundo. E o facto é que ainda que não se trate de ciência, existe alguma verdade nesta pseudociência, que mais não é do que senso comum.

A verdade é que estamos no inverno e os dias têm poucas horas de luminosidade. Muitas vezes, os dias são cinzentos e escuros. Está frio, o que nos retira alguma vontade de sair de casa e passear a céu aberto. Sentimos (a maior parte de nós) que temos longos meses de trabalho pela frente até que tenhamos a possibilidade de descansar numas merecidas férias. Sentimos que o mês de janeiro nunca mais tem fim, enquanto aguardamos o tão desejado “balão de oxigénio” a que damos o nome de salário. Sentimos o peso das despesas que tivemos com o Natal e as 1001 prendas que não devíamos ter comprado…para não falar das despesas que tivemos com o fim-de-ano!! E a dieta?? Já percebemos a esta altura que não só nos falta já a vontade para ir para o ginásio (o frio retira qualquer vontade!) como também temos pouca vontade para continuar aquela alimentação hipocalórica que não está a oferecer-nos os resultados que pretendíamos! Raios, o psicólogo devia mesmo ter razão! Que tristeza!!

Mas é claro que não me vou deixar abater por todos estes pensamentos. Este ano decidi fazer da blue Monday um happy day (e sabe Deus o difícil que isso é numa segunda-feira!!), olhando para esta data com uma perspetiva positiva! Vou começar por não reclamar por ser segunda-feira, por ter de levantar cedo, por estar frio. Quero acreditar que, pelo menos, teremos sol! A ideia será afastar de mim todo e qualquer pensamento negativo (e se puder afastar-me, ao mesmo tempo, das pessoas negativas…seja!) Quero acreditar que ao reclamar menos me irá sobrar um tempinho para degustar um copo de vinho enquanto leio um livro, vejo um filme… Vou pensar e agendar pequenos momentos a saborear durante toda a semana (fim-de-semana incluído!) A ideia é deixar de pensar a longo prazo (nas férias, por exemplo) e pensar em pequenos momentos que possam alimentar a minha alma e o bem-estar diariamente (um café com amigos, um lanche, fazer uma caminhada, passear, ir ao cinema…); Vou pensar mais em ser feliz hoje do que pensar sempre num amanhã mais brilhante e feliz que poderá nunca chegar. Decidi que irei almoçar algo que gosto muito. Sim, tenho apenas uma hora de almoço mas irei fazer uma refeição a comer um dos meus pratos favoritos (esta não é difícil de aplicar, uma vez que sou eu que confeciono a marmita!) fazendo dessa hora, uma hora de degustação prazerosa. Decidi, também, que tentarei dar um pequeno passo para levar um pouco de felicidade àqueles que se cruzarem comigo: um sorriso, um bom-dia, dois dedos de conversa com quem estiver disposto a ouvir-me…tudo banhado em “positivismo”, procurando esquecer que, como dizia Rui Veloso “para mim hoje é janeiro/ está um frio de rachar/ parece que o mundo inteiro/ se uniu para me tramar”.

Existem, como vimos, muitas e muitas razões para sentirmos que esta é uma segunda-feira ainda mais triste e desconsolada que as outras segundas-feiras. Mas a verdade é que nos compete a nós decidir qual será a atitude a termos neste início de semana e neste início de ano. Eu escolhi dizer não à blue Monday! E estou quase certa que este vai ser um dia recheado de boas energias, que de blue só terá o céu!

“Não quero esquecer quem sou”

A proposta de hoje, publicada aqui no blogue e no Jornal Fórum, vem falar de uma doença pouco simpática, a Doença de Alzheimer.

Tempo de Leitura: 3 minutos

21 de setembro foi a data escolhida para assinalar o Dia Mundial da Doença de Alzheimer. É claro que nenhuma doença será, digamos, simpática mas esta doença, neurológica e degenerativa, é uma daquelas que me assusta muito. A sua capacidade de afetar e roubar as capacidade cognitivas, assim como, paulatinamente, a nossa memória, é algo que me assusta. Quão terrível será (para quem sofre da doença e para quem rodeia o doente) perder as nossas memórias, esquecermo-nos de quem somos e daquilo que gostamos?

Foi partindo dessa premissa que dei por mim a analisar as minhas memórias e a pensar em qual seria a memória mais importante para mim até aos dias de hoje, qual seria aquela que eu quereria manter até ao fim dos meus dias. Assumo que passaram por mim algumas imagens: a primeira vez que vi as minhas sobrinhas, aqueles momentos impagáveis em que dás uma gargalhada com a tua irmã ou aquele momento em que todas as coisas no mundo ficam no sítio certo por dares um abraço apertado às pessoas que mais gostas ou até o primeiro beijo dado a uma pessoa que consideras especial. Sinceramente, gostaria no fim da minha vida de me lembrar desses momentos que citei e de mais uns quantos em que considero que fui genuinamente feliz. Contudo…não penso que fosse capaz de escolher apenas um momento. Mas uma coisa tenho como certa: escolheria sempre um momento em que me senti muito amada, em que senti que fazia parte de uma família. Eu sei que isto é um nadinha clichê mas a verdade é que me incomoda o pensamento que um dia poderei esquecer o quanto fui e sou amada por aqueles que são importantes para mim. Até aos dias de hoje não existiram muitos casos próximos dos meus afetos que sofressem de Alzheimer (felizmente). Todos os meus avós (que já faleceram) sabiam quem eram e quem eu era na hora da morte deles. E quando penso nisso com mais afinco penso o quão importante e bom isso foi tanto para eles como para mim. A despedida, na hora do falecimento, foi dura mas a verdade é que não tive de me despedir de ninguém antes dessa hora fatídica. Considero que é isso que acontece com quem sofre de Alzheimer: vamos fazendo as despedidas, aos poucos, à medida que a doença vai roubando a memória de tudo o que é e foi, até ao dia em que apenas resta um corpo, sem as vivências e memórias que ligavam aquela pessoa à sua família.

Até aos dia de hoje convivi com dois casos (infelizmente ambos já não se encontram presentes), que sofreram dessa terrível doença. Curiosamente, ambas tias-avós. Relembro o quão triste era ver a minha tia-avó a não reconhecer o seu próprio reflexo no espelho. Olhava e dizia: “olha, a minha mãe”. A vida para ela tinha ficado lá longe, numa infância há muito perdida, em que ela ainda era uma criança que brincava com bonecas. Automaticamente, toda a sua vida ulterior foi esquecida: filhos, netos, marido, deixaram de existir. Passaram a não ser mais do que seres estranhos que insistiam em cuidar dela e que viviam perto dela sem que para isso ela encontrasse uma explicação (não que ela a procurasse). Ela apenas era uma criança, que brincava com bonecas, sempre que encontrava alguma boneca das suas netas e que apenas sobrevivia aos dias.

 No segundo caso, também um caso de uma mulher e de uma tia-avó minha, percebi que esta terrível doença lhe estava a roubar o ser, as memórias e as lembranças no dia em que a fui visitar ao lar onde residiu nos seus últimos anos de vida e, no momento em que cheguei junto dela, os seus olhos não se iluminaram. Era uma tia-avó muito próxima. Uma outra avó, no que aos meus sentimentos diz respeito. E sei bem que para ela também eu era uma das meninas dos seus olhos. E por isso me foi tão difícil perceber que a luz, tão conhecida nos seus olhos, não se acendeu, quando cheguei. Na época ainda reconhecia o meu pai (o que, assumo, também me feriu. Como poderia ela reconhecer o meu pai e não me reconhecer a mim?? É claro que isto não passava de pergunta retórica para a qual não teria explicação). Pelo que, depois de cumprimentar o meu pai me colocou a pergunta que me fez perceber que naquele dia se iniciavam as despedidas: “Quem é a senhora?” A minha tia-avó que me tinha visto crescer, eu que sempre tinha sido uma das suas meninas, não era reconhecida naquele momento. Olhou para mim como a mulher feita que já era e questionou quem era a senhora. Já lá vão uns anos desde essa pergunta. A situação foi piorando e momentos houve em que se lembrava de mim e outros não…

 A minha tia viveu os últimos dias assistindo, impávida, aos dias que passavam, perdida nos seus próprios pensamentos, sem a lembrança de que um dia eu fora uma pessoa importante para ela…

 Quando hoje, perante todos estes pensamentos, coloquei para mim mesma a questão: “Que memória gostavas de guardar para sempre?” pensei em tudo o que aqui escrevo e cresceu em mim a certeza de que o importante seria guardar para sempre a memória de quem fui,  de quem sou e em quem me tornei. Gostaria, sobretudo, de ter a certeza de que não me esquecerei daqueles que me acompanharam durante a viagem. O vazio que se instalou na vida da minha tia terá sido deveras angustiante. E partir sem as memórias que criaram ao conviver connosco é demasiado pesado para quem fica. E é isso: à questão “Que memória gostavas de guardar para sempre?” responderia: a memória de mim mesma.

Carpe diem!

Para início de um mês que é, habitualmente, de férias, trouxe-vos uma crónica que procura relembrar que a vida é efémera e que há que vivê-la e aproveitá-la a 100%. Publicada aqui e no Jornal Fórum, dispensem alguns minutos para a ler e para pensar nisso! Carpe diem, amigos!

Tudo na vida “acontece”. O facto é esse: a vida simplesmente acontece. Acontecem as coisas boas e acontecem as coisas más. E a verdade é que nessas ocorrências importantes, positivas ou negativas, a maior parte das vezes a nossa vontade e a nossa atuação perante a vida pouco têm a ver com isso. Não há volta a dar: muito nas nossas vidas acontece de forma inesperada e, grande parte das vezes, isso está fora do nosso controlo. Quantas e quantas vezes a vida nos tira o tapete sem que nada o fizesse esperar? Quem de nós não conhece uma pessoa que levava uma vida regrada, com atenção às horas de sono, com prática de desporto, como é recomendado, com uma alimentação cuidada, a realizar exames  de tempos a tempos e que, de um momento para o outro, descobre uma doença oncológica, um coração fraco, uma doença incapacitante? Quem de nós não conhece um caso de uma vida ceifada na flor da idade por um problema de saúde ou por um acidente? Quem de nós não ficou já profundamente chocado com a notícia da morte ou uma doença numa criança de tenra idade? Ainda que todos preferíssemos acreditar que nada destas coisas acontecem, a verdade é que todos já passámos por uma situação dessas de um modo mais ou menos próximo. Estas coisas, más, simplesmente “aconteceram”.

É inegável que tudo pode ocorrer a qualquer momento. A vida continua a ser um mistério, uma eterna carta fechada em que tudo pode suceder a qualquer momento. Perante esta evidência, viver poderia tornar-se muito difícil. Ter a constante noção que algo pode acontecer a cada segundo criaria uma ansiedade e uma angústia enormes que tornaria impossível sobreviver a elas. Seria o suficiente para nos enlouquecer! Por isso, o nosso cérebro criou uma defesa, uma fortaleza, que nos protege desta angústia: simplesmente, não pensamos nessa possibilidade. Vivemos sem que essa dura realidade nos assalte durante tempos e tempos. E quando, infelizmente, tomamos conhecimento de que a vida pregou uma partida a alguém e a realidade nos bate de frente, abanamos, trememos nos nossos alicerces, gritamos aos quatro ventos que a vida é injusta. Ainda assim, e porque pouco ou nada há a fazer, resignamo-nos com a ideia que o mundo é injusto e seguimos em frente. Nada mais podemos fazer. E depressa o cérebro reconstrói a sua fortaleza, onde se tinha aberto uma brecha, e deixa de pensar na constante eminência de coisas menos positivas que possam acontecer.

É claro que não venho aqui questionar esta capacidade de ignorar essa realidade a maior parte do tempo. Como disse, essa é uma defesa nossa, algo que nos permite viver sem pensar no muito que não controlamos, sem pensar que a nossa vida parece ser conduzida de acordo com a vontade de outrem que não nós. Mas a verdade é que ter um pouco mais essa ideia presente poderá levar-nos a viver mais e melhor. O futuro, o momento a seguir, pode, pura e simplesmente, não existir. Então, perante essa realidade, temos que nos certificar que aproveitamos a vida como ela deve ser aproveitada. Não deixemos vontades e desejos para o dia de amanhã. Não fiquemos à espera de algo que poderá nunca chegar. Não vivamos de acordo com regras rígidas se essa não for a nossa vontade. Que se viva o presente da melhor forma, que se vá à luta por aquilo que se quer hoje e não “um dia”. Há que dar forma aos nossos desejos hoje e não num amanhã que poderá nunca chegar.

Há que viver no presente. Aproveitar cada dia e cada hora para sentir que estamos vivos e que o coração está, de facto, a bater. Conheço, e acredito que vocês também conhecerão, pessoas que deixaram de viver em vida. Porque é inegável que há muitas formas de morrer. Pessoas que colocaram o pensamento, a possibilidade de felicidade, num amanhã, num futuro que, como já referi, poderá não acontecer, não estão totalmente vivas. Viver um presente morno, que não nos satisfaz,  com os olhos focados num amanhã que será intenso, mais positivo, mais vibrante, mais não é do que sobreviver. O coração destas pessoas deixará de bater um dia, é um facto, mas a verdade é que elas já estavam sem vida há muito.

Nada neste pensamento que hoje vos trago é novo. Há muito que Horácio, autor latino, escreveu, num dos seus poemas, “Carpe diem quam minimum crédula postero” (algo como Aproveita o dia e confia o mínimo possível no amanhã). Há séculos e séculos que sabemos que a vida é breve, efémera e é frágil. Num instante, tudo acaba. Portanto, tenhamos a certeza que fazemos do nosso presente o melhor presente que podemos ter. Não deixemos nada por dizer, nada por fazer, nada por amar, nada por desejar. E, acima de tudo, não deixemos de procurar ser felizes, nem que seja um pouco, em cada dia. Só assim fará sentido ter vivido quando o nosso coração parar de bater.

O intuito desta crónica é apenas relembrar que tudo na vida pode ser efémero. Como tal, agarrem na vida a duas mãos! Vivam! CARPE DIEM…

Este país não é para fracos

Inicio o mês com uma crónica publicada aqui e no Jornal Fórum. Alguns pensamentos sobre forças e fraquezas.

3 ou 4 minutos de leitura. Enjoy!

A vida percecionada através das redes sociais tem criado uma imagem do ser humano formatada. De um modo geral todos acabam por maquilhar, um pouco ou muito, a vida que apresentam nas redes sociais para que ela obedeça aos estereótipos  a que nos fomos habituando sobre a pessoa feliz e bem-sucedida. E de que estereótipos falo eu?

Ora, apresentando-os em algumas linhas, para não roubar muito do vosso tempo, poderemos dizer que o ser humano feliz e bem sucedido que nos apresentam hoje em dia um pouco por todo o lado é, antes de mais, alguém bonito ou  que procura ser bonito. Quero com isso dizer que é alguém que pratica desporto, que cuida da sua saúde ao mesmo tempo que cuida do seu aspeto físico. Alguém que procura ter um bom emprego, que possui algum desafogo monetário. Alguém que está de bem com a vida porque gosta da vida que leva, tanto a nível profissional como a nível pessoal. Profissionalmente é alguém seguro, determinado, proativo, firme nas suas convicções, um líder nato, independente. Não são essas as características que quase todos procuram deixar passar sobre si quando se querem apresentar a nível profissional? E a nível pessoal? A esse nível gostam de mostrar a sua vida um tanto ou quanto maquilhada por uma felicidade constante, recheada de momentos felizes entre amigos e família, férias e divertimentos em locais vários e bonitos, onde servem pratos diferentes e saborosos (que não se esquecerão de fotografar). No fundo, e a ter em conta toda a informação que nos vai sendo veiculada pelas redes sociais, são pessoas inteiramente felizes e bem sucedidas tanto a nível pessoal como profissional.

Mas…é claro que tinha de haver um más…todos nós sabemos que não existem vidas perfeitas, certo? Todos nós sabemos que a vida “maquilhada” apenas com bons momentos e felicidade não existe. É claro que a felicidade são momentos e não um continuum. Então, por que raio continuamos nós a querer mostrar tanta perfeição na nossa pessoa e na nossa vida? Por que raio queremos tanto esconder que todos nós temos momentos de maior vulnerabilidade e tristeza?

O facto é que se criou uma sociedade que não aceita o feio, o pouco esforçado, o fraco, o triste, o amargurado, aquele que se apresenta sem forças para se mostrar feliz. No fundo, a sociedade não aceita toda e qualquer pessoa que não caiba nos parâmetros estereotipados criados nas redes sociais. Estamos numa sociedade que não gosta de pessoas sem brilho, e, ainda que saibamos que elas existem, prefere que elas se mantenham na sombra e em silêncio.

Mas a verdade é que, na minha forma de ver as coisas, tal como não existem pessoas absolutamente e sempre felizes, também não existem pessoas sempre fracas, pouco resilientes e tristes. Há pessoas fracas, sim, mas apenas em certos momentos ou fases da sua vida. Pessoas que se sentem fracas quando a sua vida aparece pontuada por dificuldades e sofrimentos que, naturalmente, fazem parte da vida mas com os quais a pessoa não consegue lidar naquele momento. Todos nos podemos sentir frágeis e fracos num determinado momento. A todos isso acontece. E, pergunto eu, não teremos direito a isso? Não terá essa pessoa enfraquecida e fragilizada o direito de se sentir assim, de  falar sobre isso e de, de algum modo, viver a sua dor, até que a consiga superar?

Considero que esse é um direito inalienável. Contudo, nos dias de hoje, o que assistimos é que quem se sente fraco e sem forças irá procurar escondê-lo e esconder-se. Sabe que tal não será aceite pela sociedade e portanto irá continuar a maquilhar  a sua dor e o seu sofrimento de uma alegria que não existe, de uma felicidade que não se vive, a sentir-se o único ser neste mundo que não vê a vida da forma colorida que todos os outros parecem ver. E é nesse momento que se abate o peso da solidão sobre o ser que se sente completamente errado e cinzento num mundo carregado de cor e felicidade. Daí a necessidade de se esconder. Mas a esses, os que se sentem vulneráveis e fracos, digo em alta voz que a vulnerabilidade é apenas um estado do ser humano, tal como o é a felicidade. E digo que é um estado que se pode alterar. Como tal, há que aceitar a fraqueza e a fragilidade que existe em nós e ter força para não lhes sucumbir. Há que aceitar que temos momentos de maior tristeza e maior fraqueza, percebendo que não podemos estar sempre felizes mas também não podemos estar sempre tristes. Pensar que só sabemos o que é ser feliz, sentir-se forte e resiliente porque já aprendemos o que é sentir-se triste, fraco e sem forças. E, depois disso tudo, concluir que é sempre possível superar as nossa fragilidades e transformá-las em força e coragem para ultrapassar essa montanha que por momentos nos parece intransponível.

Há que assumi-lo: por mais que se tente maquilhar essa realidade, todos temos momentos de vulnerabilidade, de tristeza, momentos em que nos faltam as forças. Por isso, há que deixar de acreditar que este país não é para fracos e aceitarmo-nos e assumirmo-nos tal como somos: com forças e fraquezas, com momentos bons e outros menos bons. Com episódios coloridos, em certos momentos,  e episódios cinzentos, em outros tantos. Há que assumir sem medos que nem sempre nos sentimos fortes e felizes. E assumi-lo, sem embaraços, perante todos. Deixarmo-nos de “maquilhar” de cores vivas a nossa vida só para parecer que somos iguais aos outros todos. E, por fim, há que acreditar, acima de tudo, que saberemos superar os momentos menos bons, que não nos deixaremos vergar pelas dores, fraquezas e vulnerabilidades. Afinal, aceitar a nossa vulnerabilidade como parte integrante do nosso ser será uma forma de, mais tarde, a transformar em força e coragem para superar as fragilidades. Será uma forma de superar os dias cinzentos e dar lugar aos dias coloridos.

E já chegou o horário de inverno…

A crónica desta semana vem falar de um pequeno ódio de estimação: o horário de inverno. Partilho a minha opinião com os leitores do blogue e partilhei-a, simultaneamente, com os leitores do Jornal Fórum.

E por aí? Adeptos do horário de inverno ou, como eu, preferem o horário de verão?

E chegou o último fim de semana de outubro e com ele o horário de inverno…Acontece isso todos os anos desde que me conheço como pessoa… E, para não deixar quaisquer dúvidas, informo desde as primeiras linhas desta crónica que o detesto e que vejo muito pouco de positivo nele. Para mim, esse malnascido horário de inverno apenas tem um aspeto positivo (que bem vistas as coisas nem é assim nada de mais!): oferecer-me uma hora de sono extra, uma única noite no ano, num dia em que a mim nem me traz grandes benefícios (Não tenho o hábito (ou a necessidade) de levantar muito cedo ao domingo…)

Mas a verdade é que todos os anos eu tenho de passar por esta alteração horária. E todos os anos acalento, secretamente, a esperança que seja este o ano em que se decidirá pelo não à mudança para o horário de inverno mas, invariavelmente, todos os anos, vejo a minha esperança defraudada e a hora mudar: “Quando forem duas…atrase para a uma”. E eis que está dado o passo para que comecem os dias cinzentos, os dias frios, os dias pequeníssimos.

Procurando encontrar uma forma de gostar desta mudança horária, fui tentar perceber quais eram as razões inerentes a essa mudança de hora. Talvez a mudança tivesse uma explicação simpática. E ao que parece, tudo começou com uma ideia peregrina de Benjamin Franklin em 1784… Na altura a ideia surgiu com o intuito de poupar velas. Ainda assim, e pelo que fui lendo por aí, esta ideia apenas voltaria a surgir e seria aplicada em 1916, com o intuito, desta feita, de poupar carvão. A ideia era que não se desperdiçassem horas de luz durante as manhãs. As pessoas acabariam por levantar mais cedo, aproveitando, assim, melhor o dia. Com o início da Iª Guerra Mundial países como a Alemanha e a Grã-Bretanha adotaram este “Daylight saving time” (como ficou conhecido) a fim de se poder poupar e economizar tendo em conta o transtorno da guerra. Terminada a guerra, houve quem abandonasse a alteração de horário. O Daylight saving time foi retomado por várias nações, em 1939, demonstrando que um mal (2ª Guerra Mundial) nunca vem só… Mais uma vez, ao terminar a guerra, houve países que foram abandonando as mudanças de hora no horário de inverno e no horário de verão. E, pelo que fui lendo, andou-se assim um pouco ao sabor das ondas, até aos anos 70, data em que o Daylight Saving Time foi uniformizado tendo em conta as preocupações, mais uma vez económicas, que surgiram decorrentes dos obstáculos que os países árabes começaram a colocar na aquisição do precioso “ouro negro”. Pelo que entendi, a ideia foi sempre a de poupar… e não de fazer as pessoas mais felizes… No que aos países da União Europeia diz respeito, esta “tradição” mantém-se, até aos dias de hoje, devido a uma diretiva datada de 1981, que determina que os seus estados-membros devem entrar na hora de inverno no último domingo de outubro e na hora de verão no último domingo de março. E assim, de seis em seis meses, acontece-nos uma noite com mais uma hora (horário de inverno) e uma noite com menos uma hora (horário de verão). E, apesar de já ter passado por isto desde que me conheço por pessoa, ainda não me consegui habituar e muito menos consegui gostar desta mudança horária, sobretudo quando a mudança se faz para o horário de inverno.

Dou por mim a pensar: será que isto ainda faz sentido? Não poderíamos ficar eternamente na hora de verão? Será que este horário ajuda a poupar o que quer que seja? Tenho as minhas dúvidas, nos tempos que correm. O que sei é que a hora de verão é bem mais simpática!

Ok, se a mantivéssemos levantávamos às 8 horas da manhã e poderia estar ainda um pouco escuro. Mas… “assim como assim”, é suposto os dias de inverno serem escuros e cinzentos. Não me incomodaria muito, penso eu, levantar e ainda ver estrelas no céu…rapidamente o sol iria levantar e o dia acordar! Agora o que consegue tirar-me do sério é ver que daqui mais uns dias serão 17 horas e já estará praticamente de noite! Os dias são minúsculos. As noites são intermináveis. Quem pode ter vontade de praticar desporto depois de estar escuro como breu? Quem pode ter vontade de passear, de fazer turismo? Basta um almoço um pouco mais prolongado para se perder a tarde toda e impossibilitar qualquer tipo de visita que tenha de se realizar na rua, sob a luz do sol. Parece-me que este horário demoníaco apenas se mantém para obrigar as pessoas a estar em casa. As horas de sol, efetivas, são muito poucas para mim. No horário de verão, terminamos o trabalho e temos tempo para apreciar o resto do dia, passear, ler um livro numa varanda, beber algo numa esplanada, ou até mesmo realizar as tarefas caseiras, aproveitando os bons pares de horas que ainda temos pela frente com luz solar. Tal é impossível no horário de inverno. O inverno é cinzento, escuro e frio. Este horário só ajuda a torná-lo ainda mais feio, ainda menos suportável. Não tenho base científica para o que vou dizer, mas acredito que as depressões sejam em maior número neste horário. Abomino esta mudança! Para mim é a verdadeira machadada no verão que já nos abandonou.

Se bem me lembro houve uns anos em que a mudança de horário não se verificou. Se a memória não me atraiçoa, lembro que no pico do verão eram quase 22 horas quando se dava o anoitecer. Isso agradava-me… e vivo na esperança que o mesmo volte a suceder.

Estamos em novembro, 2022. E ainda não foi este ano que cortámos relações com o horário de inverno! Para auferir de uma só noite de sono com mais uma hora ganhámos um anoitecer prematuro…e rapidamente verificamos que às 18 já não existe sol! Durante os próximos 6 meses estaremos sob o domínio deste horário que nos obriga a conviver com a noite escura muitas mais horas do que aquelas que eu quereria e gostaria… Como disse, não gosto deste horário. Apresento o meu veemente NÃO! a esta alteração. E vivo na esperança que um dia se acabe com esta imposição do horário de inverno/ horário de verão. Terei, com toda a certeza, um nível ligeiramente mais elevado de felicidade!

Depressão pós-férias??

Bem vindos a mais um mês de setembro!

Férias terminadas, aqui estamos nós de regresso. E de que forma poderíamos começar o mês de setembro, o período pós-férias, sem ser com uma crónica que aborda, precisamente, esse pós-férias e a ligeira depressão a ele inerente?

O meu conselho: leiam a crónica, aqui ou em papel no @Jornal Fórum

Se necessário, não hesitem em colocar em prática alguns dos conselhos que por lá vos deixo. Enjoy!

Photo by Kinga Cichewicz on Unsplash

Lamento ser a portadora de más notícias mas a verdade é que sim, está aí o temível mês de setembro. Quer isto dizer que temos à porta um dos meses mais difíceis do ano: o mês da depressão pós-férias, o mês que apesar de se apresentar, quase sempre, de céu azul e sol brilhante, nos parece mais sombrio e cinzento que um mês de muita chuva no inverno. Numa só frase: as férias acabaram e o regresso ao trabalho está já aí! … Pausa para respirar…eu sei que não é fácil encarar esta realidade!

Sei que muitos de vocês estão, quando pensam nisso, com uma ligeira sensação de morte na alma. Questionam-se, neste preciso momento, onde irão encontrar forças para aguentar estes onze meses que nos surgem pela frente. É claro que outros há que me dirão que gostam muito de trabalhar e que anseiam por reencontrar o seu local de trabalho e os seus colegas. Mas, convenhamos, todos nós, de uma forma mais ou menos intensa, estaremos a sentir uma pequena “depressão pós-férias”. Todos estaremos a questionar onde iremos encontrar a motivação para trabalhar estes longos meses que temos pela frente, onde iremos encontrar a vontade para sorrir e fazer conversa de circunstância com os colegas, onde iremos encontrar forças para levantar cedo todos os dias de manhã. E, quase poderia apostar que a maior parte daqueles que se encontram a ler a crónica neste momento já consultaram o calendário para verificar em que dias calham os próximos feriados nacionais! Respirem fundo (e esta informação é para quem ainda não consultou o calendário) meus amigos: até dezembro, não vislumbro um fim-de-semana prolongado que seja! Faça-se silêncio para recuperarmos o fôlego após essa informação…

A verdade é que, ainda que pareça que estou a ser exagerada naquilo que estou a dizer o regresso ao trabalho não é tão fácil como gostaríamos de acreditar e todos, de um modo mais ou menos intenso, sentimos uma pequena depressão, um pequeno stress pós-férias. Esse stress pode manifestar-se como referi, numa enorme dificuldade em levantar cedo, numa pouca vontade de largar a “roupa de verão e o chinelo” pela roupa, habitualmente mais formal, do dia-a-dia num emprego ou até nalguma dificuldade em reencontrar o fio-à-meada (Perceber em que ponto tinham ficado as nossas tarefas antes das férias). Ainda assim, esta “depressão pós-férias” pode ser mais intensa e manifestar-se fisicamente em dores musculares, dores de cabeça, insónias, ansiedade e até problemas gastrointestinais.

“Estarei em depressão?” “Que poderei fazer quanto a isso?”- serão as questões colocadas, aqui chegados. Posso dizer-vos, antes de mais, que não existe, à partida, razões para preocupações de maior. Ainda que a palavra “depressão” nos possa assustar um pouco, não podemos olhar para esta condição como uma condição clínica mas apenas como uma maior dificuldade em adaptar-se, de novo, às exigências do trabalho. Ainda assim, o melhor será não sentir qualquer tipo de sintoma pelo que algumas medidas podem ser tomadas antes de voltar para que essa transição “férias-trabalho” possa decorrer de forma mais calma e menos agressiva.

A primeira grande medida a ser tomada – e se tiver essa possibilidade – é a de tirar férias de forma faseada. Ter um mês completo de férias até pode ser bom para algumas pessoas. Contudo, pensar que os próximos onze meses não terão qualquer tipo de descanso a não ser o fim-de-semana poderá ser razão para nos mergulhar na mais profunda tristeza. Tendo essa possibilidade, façam férias faseadas.

Outra medida que me parece ser eficiente é a de não transitar diretamente do local de férias para o local de trabalho. Tentar ter uns dias de descanso e dolce fare niente em casa, sem grandes correrias, poderá ajudar-nos a preparar, física e mentalmente, para o regresso ao trabalho.

Para iniciar um novo ano de trabalho com um sorriso na cara há que, também, retomar os bons e velhos hábitos. Regressar à alimentação um pouco mais cuidada, regressar ao exercício físico, adquirir uma rotina mais ativa. Tais práticas irão ajudar, com certeza, a enfrentar com melhores olhos este regresso ao trabalho.

Acima de tudo convém não esquecer que há vida para além das férias. Existem fins-de-semana, existirão alguns (poucos) feriados. Reúnam com amigos e família para um café, um jantar, um passeio, relembrem as férias que passaram, programem as próximas. A perspetiva de dias mais positivos ajuda-nos a melhorar a nossa ligeira depressão, acreditem!

E, por último mas não menos importante: sejam agradecidos. Procurem todos os dias uma razão para estar feliz nos empregos que têm. Por difícil que isto, por vezes, possa parecer, encontramos, quase sempre, se a procurarmos, uma razão para sorrir e agradecer…

E com isto vos desejo um bom setembro e um bom regresso à vossa atividade profissional!

Para os que já regressaram uma vez que usufruíram das férias mais cedo…espero que a depressão pós-férias já tenha passado!

Niksen – A arte de fazer nada

A última crónica antes do blogue ir de férias foi publicada no Jornal Fórum Covilhã e aqui no blogue.

Hoje falamos de não fazer nada (e ser capaz de o fazer é uma arte!). Enjoy

Estamos no final do mês de julho…está aí à porta o mês de agosto, mês de férias por excelência. Quer seja em junho, julho ou agosto, o certo é que o verão traz aquele período em que a maior parte de nós goza de um período de férias mais ou menos longo que nos permite retemperar forças para mais um ano de trabalho que surgirá, mais coisa menos coisa, pelos inícios de setembro.

É neste período de férias que decidimos que iremos fazer tudo aquilo para o qual não tivemos tempo durante todo aquele interminável ano: ler, atualizar filmes e séries que se encontram pendentes há tantos meses, levantar cedo e praticar aquela corridinha, aquela voltinha de bicicleta, aquela caminhada. Iremos, como é suposto num país em que o verão é tão soalheiro e quente, passar dias nas praias e nas piscinas. E, tal como todos os anos, iremos chegar ao final das férias a sentirmo-nos mais cansados do que estávamos no início das mesmas e a pensar –  só para nós mesmos porque não temos coragem de o admitir aos outros – que precisamos de férias das próprias férias. A verdade é que acabamos por ter ainda mais atividade durante os dias de férias do que durante os longos meses de trabalho. Não recuperamos fisicamente até porque não se podem recuperar 11 meses de desgaste físico e/ ou mental em pouco mais de três semanas (na melhor das hipóteses) e porque, sobretudo, não nos permitimos parar um pouco e, efetivamente, nada fazer.

Deste modo, e tal como em todos os outros anos, iremos pensar que necessitamos mudar de vida e que setembro vai ser, mais uma vez, o mês das decisões e da mudança (Iremos aprender a levar a nossa vida com mais calma, a não nos deixarmos levar pelo stress, aprender a controlar a ansiedade, aprender a dormir com qualidade e as horas que é suposto, viver ao máximo cada momento, cuidar mais da nossa saúde física e mental, praticar mais exercício, conseguir encontrar tempo para nós próprios e para o nosso bem-estar e, claro, focar-nos em reforçar e melhorar os nossos níveis de motivação ou até a nossa autoestima. No fundo, iremos ser mais felizes.  

E tal não será difícil uma vez que, nunca como agora, existiram as ferramentas para nos ajudar a alcançar todos estes propósitos. Por um lado, proliferam como cogumelos os livros de autoajuda nas livrarias. Por outro, e com um smartphone sempre ao nosso alcance, estão também à nossa disposição as suas apps de saúde, fitness, promoção de resiliência e de bem-estar. As escolhas são muitas e variadas e os preços também. Contudo, a questão que se me coloca é: “necessitaremos mesmo de todas essas “apps” e destes livros de autoajuda?”

Parece-me que não. Aquilo que, quanto a mim, necessitamos é de parar, estar quietos e respirar profundamente, sem pensar nem fazer nada. No fundo, o que estou a defender é que todos precisamos de pôr em prática a tendência holandesa a que deram o nome de Niksen. E o que é isso do Niksen?

Poderia resumir numa só frase o que se entende por Niksen: é a capacidade de não fazer nada e ser feliz. É não ter qualquer objetivo a ser atingido naquele momento. Praticar o niksen é ter a capacidade de desligar completamente do mundo que nos rodeia e até de nós próprios, estando em completa inatividade.

Dito assim, com essa simplicidade, torna-se quase risível. Todos temos uma pequena voz neste momento a dizer-nos: “é para não fazer nada?! Nisso eu sou bom! Vamos lá!”.

Mas a verdade é que num mundo que gira tão depressa e em que estamos sempre ligados, será assim tão fácil desligarmos? Provavelmente não! E é por isso que praticar o niksen é algo que tem de ser aprendido. Sugere-se iniciar esta prática por 10 ou 15 minutos diários, alargando esses minutos até aos 60 minutos quando tal for confortável para o praticante. E o que se fará durante esses minutos? Reforço, uma vez mais: nada! A ideia é apenas estar sentado e observar, a uma janela (por exemplo) o mundo. Sentar-se afastado de tudo o que seja computador, smartphone, televisão. Fazer-se acompanhar de alguma bebida que nos seja agradável e limitarmo-nos a estar, observar. Dar um passeio também poderá considerar-se praticar o niksen. Mas, volto a repetir, longe de qualquer objeto tecnológico. Passear só porque sim e não numa caminhada onde estaremos a contar os passos, o tempo em que caminhámos, as calorias que queimámos. Apenas caminhar, observando o que nos rodeia, limitando-nos a praticar o ato mecânico de caminhar.

Dizem os praticantes de niksen que tal atividade (ou seria melhor dizer, inatividade?) permite reduzir a ansiedade e o stress, ao mesmo tempo que fortalece o sistema imunitário. É referido que este “sonhar acordado” (efeito inevitável destes momentos de não fazer nada) poderá aumentar a criatividade dos seus praticantes, ajudar a encontrar soluções para vários problemas, tonando as pessoas mais decididas e com raciocínio mais rápido.

E é esta a minha proposta: comecem a praticar o niksen desde já nas vossas férias, preparando o vosso regresso ao trabalho, e iniciem a uma nova forma de estar na vida pessoal e profissional menos ansiosa, com mais bem-estar e mais feliz! Boas férias!

Monsieur Bonjour

A crónica desta semana, publicada aqui e no Jornal Fórum, traz a rubrica “Vidas – entre a realidade e a ficção” e fala de uma personagem a quem dei o nome de Monsieur Bonjour. Venham daí conhecê-lo.

Podem ler a crónica, também, no endereço: https://www.forumcovilha.pt/noticias/noticia/?idn=33874&fbclid=IwAR1Do6PtKIJ8DYVsi-qbpejBPbG3Asz-whcHA_EC8sFXhsqInG6juR9natY

Apesar de ser um corpinho com sangue 100% português, com pai e mãe saídos da Beira, quis o destino que viesse a abrir os olhos, pela primeira vez, em território francês. Contudo, e ainda durante a minha infância, bem jovem, vim viver para Portugal. Assumo que o Portugal dos anos 80 era bem diferente do país que eu conhecia. Em muitos aspetos considero que sofri um choque cultural. Contudo, sobre as grandes diferenças encontradas falarei outro dia. Do que quero falar hoje é de uma novidade que aqui encontrei, de um dos hábitos mais comuns que este país apresentava e que muito me agradou: O hábito das pessoas passarem na rua e de se cumprimentarem!!

Para quem vinha de uma cidade com uma dimensão considerável em que os cidadãos se comportavam de forma mais fria e menos humana, esse hábito foi para mim algo de magnífico. E, como seria de esperar de uma conversadora como eu, abracei este hábito como se o tivesse tido desde o primeiro dia do nascimento e passei a dizer “Bom dia” a toda a gente que se cruzava comigo no meu caminho para a escola.

Foi nessas minhas caminhadas que conheci aquele que viria a batizar de “Monsieur Bonjour” (Senhor Bom Dia – diga-se de passagem que a língua francesa ainda estava muito marcada na minha memória…). Monsieur Bonjour era um senhor com quem me cruzava todos os dias de manhã. E todos os dias o senhor, que tinha alguma dificuldade em caminhar, parava, quando se apercebia que eu vinha lá, preparando o seu “Bom dia”. Todos os dias, durante muitos anos, este cenário se desenrolou da mesma forma. Por isso o batizei como Mr. Bonjour. E todos os dias ficava com a sensação que aquele bom dia era importante para ele. Como caracterizar o Monsieur Bonjour?

Poderia dizer que era uma excelente pessoa. Que trazia rebuçados nos bolsos para as crianças…Mas não era o caso. Era um homem que parecia zangado com a vida, dono de um olhar sem brilho… Quando atuávamos em bando, correndo pelas ruas, perturbando simultaneamente a paz das ruas e o lento caminhar de Mr. Bonjour,não raras vezes éramos brindados com um chorrilho de asneiras… Era um solitário…talvez o olhar vazio se devesse a essa solidão. Penso que seria viúvo…nunca lhe conheci família…nem sequer um animal de companhia. Vivia sozinho, num casebre tão inseguro nos seus alicerces quanto o sr. Bonjour nas suas pernas…Casa e dono apresentavam o mesmo ar miserável e abandonado.

 Apesar de pouco simpático no geral, sempre sentia que Mr. Bonjour aguardava pelo meu “Bom dia”.

 Hoje, pensando nesta história, sei que, com a inocência da criança que eu era na época, tornei o mundo do Mr. Bonjour mais simpático e mais aceitável. Dei-lhe uma outra luz (pelo menos nos ínfimos momentos entre o passar por ele, olhar para ele, dizer bom dia e ouvir a resposta). Ofereci-lhe o olhar de um ser humano, tornei-o menos transparente (alcoólico e zangado com a vida, tinha tendência a ser ignorado pelas “pessoas de bem”). Eu não desviei o olhar como grande parte das pessoas faziam e fi-lo merecedor de um bom dia. Sim, foi pouco. Não foi nada. Mas sempre senti que, para ele, aquele bom dia vindo de uma criança de pouco mais de 7 anos, era uma esperança no futuro e na humanidade. Sempre senti que o Mr. Bonjour aguardava ansiosamente por esse bom dia. Hoje percebo que o tornei mais pessoa e menos coisa. Mostrei-lhe que era um homem digno do olhar de uma criança, para além do idoso consumido pelo álcool e pela amargura. Sem querer, sem pensar nisso, agi corretamente…. E hoje, quando penso no assunto, fico satisfeita, por, na minha inocência, ter abraçado um costume tão nosso e assim ter tornado, ainda que de uma forma tão ténue, a vida do Sr. Bonjour mais doce.

Fui estudar para fora e deixei de fazer aquele percurso a pé. Deixei de ver o Senhor Bom dia. Não sei o que foi feito dele…sei que o casebre desapareceu. Foi  cedendo lentamente à passagem do tempo ao abandono, foi mais tarde e deu lugar a um estacionamento para um carro…Em tempos ouvi que o tinham levado para um lar. Sei que deixei de o ver nas ruas.  Àquele a quem tantas vezes disse bom dia não foi possível dizer até já… nem adeus… Desejo que naquela nova casa que ele descobriu (o lar), quando abandonou as ruas da minha “vilinha”, possa ter encontrado alguém que, todos os dias, ao passar por ele, lhe dissesse “bom dia, como está?”. Espero que tenha encontrado por lá pessoas que o não “coisificassem” e que o tivessem tratado como uma pessoa, para além do olhar frio e do mau feitio. Desejo que tivesse encontrado alguém que lhe adoçasse o olhar até à hora em que abandonou o mundo. E gosto de pensar que, na hora em que o abandonou, seguiu para o outro mundo uma alma bem mais feliz. E gosto de pensar que, na memória dele terá ficado aquela menina pequenina e rabina que não se assustou com os seus maus modos e que tantas vezes lhe disse “bom dia!”

Ensinas-me?…

A crónica que vos trago hoje inaugura a minha mais recente colaboração com um jornal, desta feita, com o Jornal Fórum Covilhã. Como tal, convido-vos a lê-la, aqui no blogue, ou em papel, no semanário em questão.

Podemos ler, num muro junto ao Colégio das Freiras, aqui na Covilhã, escrito em letras garrafais a seguinte frase: “Ensinas-me a olhar para ti sem querer beijar-te?” Não sei quem a escreveu. A assinatura parece-me de um/ uma certo(a) JP sendo “o” (vou optar por achar que é um homem) JP o autor de mais algumas frases espalhadas pela Covilhã e arredores tais como “Liberdade? Quero a prisão dos teus braços” e “Faz as malas! Fugimos hoje!”. Claramente este JP será uma pessoa apaixonada levando-o, essa paixão, a expressar-se pelas ruas das cidades. Não vou aqui questionar a atitude (incorreta para muitos) de assim exprimir a sua vontade e o seu sentimento em paredes alheias. Aquilo de que quero falar-vos, em vez disso, é da emoção que sinto associada a essas confissões de amor.

Começo por dizer que gosto de ler as mensagens escritas que vamos encontrando aqui e ali nas ruas desta e de outras cidades. Aprecio a “poesia” e os sentimentos espalhados pelas paredes, sem qualquer pudor. Esta “Ensinas-me a olhar para ti sem querer beijar-te” é uma das minhas preferidas. Gosto dela e identifico-me com ela.

Esta identificação deve-se ao facto de eu pensar que haverá sempre alguém, na nossa vida, que nos deixa com vontade de a beijar sempre que a vemos. Há pessoas que pertenceram, em determinado momento, ao nosso presente e que, apesar de não pertencerem mais, deixaram uma marca indelével na nossa alma e coração. São elas pessoas especiais que, ao terem passado pela nossa vida, criaram uma ligação que se tornou inquebrável, que resiste, incólume, à passagem do tempo. E isso acontece porque esse encontro entre duas pessoas criou uma energia (positiva, sem dúvida) que não desaparece nunca, por mais que o tempo passe, e por mais que não se alimente esses encontros e reencontros. Uma troca de olhares e o tempo fica em suspenso, deixando um raio de luz e energia passar.

Quanto a mim isso tem uma explicação: são almas que se reconhecem e se tocam! Penso que são almas que pertenceram à vida um do outro em muitas outras vidas e, por isso, se reconhecem em qualquer tempo e lugar. São essas pessoas/ almas especiais que fazem que nos sintamos sempre acolhidos, aconchegados e em casa quando estamos com eles. São aquelas pessoas que nos fazem sentir que os ombros são largos o suficiente para acolher a nossa alma cansada e desgastada, podendo ali repousá-la. São aquelas pessoas que nos fazem pensar que nada no mundo é impossível. São aquelas pessoas que, quando vemos, queremos sempre abraçar e beijar, percebendo que, finalmente podemos abrandar o ritmo porque a nossa alma reencontrou o lugar que procurava.

Contudo, como o tempo e o lugar nem sempre são propícios às vontades e necessidades da nossa alma, por vezes, as almas andam desavindas nesse mundo. A ligação, que seria natural, deixa de poder existir. Mas o elo de ligação está lá. E, quando se encontram, quando existe a troca de olhares, surge essa energia e essa vontade do beijo, do abraço, essa força que indica que as almas se reencontraram. E surge então a questão no fundo do olhar: “Ensinas-me a olhar para ti sem querer beijar-te?”. No fundo, e esperando um gesto nobre do outro perguntamos:  “ensinas a minha alma a viver sem a tua?”

É assim que interpreto essa frase escrita num muro da Covilhã. É isto que penso sempre que a leio. E assumo que sempre que passo os olhos por ela, um ligeiro sorriso nasce nos meus lábios gerado por um monte de recordações (desta e doutras vidas, quem sabe?) que afloram à minha memória. E, por momentos, a alma volta a sentir aquele sentimento quentinho e aconchegante que a faz sentir-se em casa.